quarta-feira, 17 de novembro de 2010

FRESH x AQUARIUS FRESH - Estudo de Caso

Segue abaixo uma compilação do estudo de caso que fiz como trabalho final para o módulo de Propriedade Industrial no LL.M. Já não é um caso tão recente (final de 2009) mas trata de um assunto de grande importância para toda empresa: MARCA.

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A multinacional Kraft Foods, segunda maior empresa de alimentos do mundo, possuidora de 5 plantas industriais em nosso país e faturamento mundial em torno de U$ 50 bilhões é também proprietária do registro junto ao INPI da marca Fresh. Este registro é de sua propriedade desde 1984 e se refere à bebida em pó utilizada para preparo de refrescos de sabores variados.

Com a entrada no mercado de um produto da Coca-Cola, qual seja a Aquarius Fresh, refrigerante de baixa caloria levemente gaseificado, a Kraft entendeu que a referida marca lhe causava danos e invadia seus direitos, além de ferir a lei de Propriedade Industrial, Lei nº. 9.279/96.

Dessa forma, a Kraft ingressou com uma ação judicial (processo nº. 0083210-97.2007.8.19.0001 TJ/RJ), em 16/06/2007, em face da Coca-Cola tanto para impedir a utilização da marca Aquarius Fresh, no que diz respeito ao Fresh, como também pedindo danos morais, pois os consumidores estariam supostamente sendo levados a erro pela utilização da mesma palavra no produto da Coca-Cola.

A demanda foi distribuída para 2ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro e já foi apreciada pela segunda instância do referido Tribunal de Justiça, onde foi julgada improcedente a ação, pela Terceira Câmara, sob o argumento principal que a palavra “Fresh” associada a outra palavra é mais uma qualificadora do que propriamente a designação do produto. Tal raciocínio seria o mesmo da utilização das palavras “light”, “diet” etc.

Outra questão debatida foi a apresentação dos produtos, pois o suco Fresh está disponível em envelopes de 25g contendo o pó solúvel em água, já a Aquarius Fresh é apresentada em garrafas plásticas de 600ml e de 1,5l e efetivamente é um refrigerante de baixa caloria levemente gaseificado. Inclusive o público alvo dos produtos é claramente diferenciado, não há confusão em um consumidor que deseja comprar um refrigerante com um consumidor que procura por um suco solúvel.

O Desembargador Fernando Foch, em sua decisão, levou em conta ainda que a palavra de origem inglesa “fresh” já está incorporada ao vocabulário brasileiro e é amplamente utilizada nos mais diversos gêneros de produtos que encontramos nos supermercados. Em razão disso o desembargador considerou que se a Kraft consegue “conviver” com tantos produtos utilizando a mesma expressão, também poderá “conviver” com o produto da Coca-Cola.

Em análise técnica ao presente caso podemos verificar que a lide circunda os artigos 124, XIX, 126, §2º, 129, 130 e 131 todos da Lei nº. 9.279/96, pois a Kraft defendeu primeiramente que o registro da marca Aquarius Fresh deveria ser indeferido de plano, pois sua marca, a Fresh, seria uma marca notoriamente conhecida e que em caso contrário o poder judiciário teria o dever de anular o registro da marca da Coca-Cola com objetivo de defender seus direitos.

Conforme podemos verificar o presente caso é de discussão muito subjetiva, pois o julgador deverá sopesar tanto a questão da notoriedade da marca como de sua inclusão em um determinado segmento de produtos.

As ponderações feitas tanto pelo Juiz quanto pelo Desembargador, a meu ver, são muito pertinentes. Quando do registro da marca Fresh pela Kraft Foods, em 1984, a expressão não tinha um significado claro para os consumidores do produto e realmente funcionava como um diferencial para o produto à que se vincula.

Entretanto, ao longo de 16 anos, com o maior acesso a informação, com a globalização e forte atuação da mídia utilizando cada vez mais de expressões em idiomas diversos, e em especial a língua inglesa não é razoável sustentar que os consumidores não saibam que a palavra faz referência a algo refrescante.

Desse modo, a marca, atualmente, tem mais um sentido denotativo e de adjetivo do produto do que efetivamente um distinção individualizada. Além disso, como bem argumentado nas decisões, a mesma expressão tem sido exaustivamente utilizada em diversos produtos, inclusive um delas exatamente do mesmo segmento que o produto da Kraft, qual seja, o Su-Fresh, e não houve qualquer movimento da empresa em reprimir outros concorrentes.

Mas neste caso específico tratando-se de uma concorrência com a Coca-Cola, que tem grande potencial ecômico-financeiro e que é detentora de um monopólio do mercado de refrigerantes, houve o interesse na lide, o que soa um tanto estranho, diga-se de passagem.

De qualquer modo a lide foi conduzida de acordo com a Lei que rege sobre a matéria e tratada dentro da mais perfeita técnica.

Por fim, concluo pela concordância com a decisão de nosso Tribunal de Justiça por também entender como descabida a pretensão da Kraft em ter o uso exclusivo de uma palavra que em seu significado, repise-se, de notório conhecimento pelo consumidor, refere à um adjetivo que pode ser atribuído a diversos produtos, o que, faticamente, já ocorre.

Referências:
- Clipping da Justiça Federal de Goiás de 02/10/2009;

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